sábado, 11 de abril de 2009

II - O ENCONTRO


Numa sala grande, entre mapas, lousas e projetores, além de uma grande mesa para reunião, estavam cinco homens conversando acaloradamente. Um deles, aparentando entre 65 e 70 anos, usava terno cinza de corte perfeito, sapatos pretos de pelica e seus cabelos eram bastante grisalhos,
voltou-se para mim e indagou:

- Tem hábito de chegar atrasado em seus compromissos sr. Montezuma? - mas, parecendo arrependido do comentário acrescentou:

- Esquece… eu já esperava por isso. Sou o Dr. Constantino, seu contratante - disse - apresentando-me as pessoas que ali estavam.

- Estes são: o músico e instrumentista italiano, Felipo Martinelli; o físico americano Bob Carlson, o sertanista Antônio Cerrado e, por fim, o biólogo Sérgio Azevedo - voltou-se então para os apresentados e disse:

- Senhores, este é o jornalista escritor Montezuma de Albuquerque.
Acenaram-me com a cabeça como se desejassem boas vindas. Tive a impressão que olhavam para mim com certa curiosidade. “Ah! Como eu gostaria de saber o que se passava pela cabeça de cada um deles!” Porém, percebi que o único que realmente não estava por dentro de nada do estava acontecendo, era eu. Então, arrisquei uma pergunta:

- Não entendi o que pode haver em comum entre um físico, um sertanista, um instrumentista, um biólogo e um escritor. O que deseja, Dr. Constantino, com esse grupo tão heterogêneo? - perguntei ansioso por uma resposta que se adequassse à situação.

- Tudo a seu tempo, Sr. Montezuma. Mas posso afirmar-lhe que todos serão úteis na hora certa. Mas, já vamos falar sobre o que interessa… tome um café e se acalme - disse o nosso contratante.

Tomamos um café enquanto era discutido futebol, carnaval e política ambiental. Todos pareciam descontraídos, mas, eu, no entanto, não conseguia me interessar por aquela conversa descompromissada. Só uma coisa me interessava: eu queria saber se sairia dali com um emprego garantido. Olhei para eles e percebi que Felipo Martinelli, ao falar, gesticulava muito fazendo com que seu cabelo castanho escuro caísse sobre sua testa, aparentava 46 anos de idade e tinha estatura mediana; Bob Carlson vestia um um fino paletó esporte com couro nos cotovelos e calças rancheiras, tinha os cabelos loiros e a pele tão clara que deixava aparecer algumas sardas, era alto e quando sorria fechava os olhos azulados; Antônio Cerrado vestia jeans, seus cabelos eram pretos e lisos, a pele morena e queimada pelo sol mostrava que estava acostumado a andar pelas regiões mais quentes do país, magro e alto não fazia tipo atlético; Sérgio Azevedo aparentava ser o mais jovem; os cabelos eram levemente ondulados, estatura baixa, usava óculos de grau com aros escuros, sorria amavelmente quando lhe dirigiam a palavra; eu, com meu traje e calçados puídos pelo uso contínuo, sentia-me bastante desconfortável. Um bom banho de loja e o problema estaria resolvido.

- Onde fica o banheiro - perguntei.

- No corredor à sua direita, última porta - disse Constantino.

Agradeci e segui pelo caminho indicado. Ao abrir a porta do banheiro deparei-me com um grande espelho numa das paredes; olhei atentamente para a figura refletida nele e pude ver um homem com 44 anos de idade, de boa estatura, cabelos castanhos tão claros que mais pareciam louros, com dentes alvos e perfeitos mas, a roupa que usava não ajudava muito na aparência. Voltei a pensar na vida difícil e pensei: “tenho que conseguir este emprego, caso contrário, não sei o que será de mim“.

Meus pensamentos foram interrompidos:

- Senhores, queiram se aproximar, por favor - pediu o Dr. Constantino apontando para a grande mesa e acrescentando: chegou a hora de saberem o motivo dessa nossa reunião - ligou um projetor e começou a explanar o que aconteceria dali para a frente.

- Antes que me esqueça - esclareceu - vamos para Mato Grosso e, em Cuiabá, se juntarão ao nosso grupo mais duas pessoas: uma historiadora e arqueóloga e uma geóloga, renomadas. Bem, vamos ao que interessa - prosseguiu ele - em 1925, aproximadamente, desapareceu, no estado de Mato Grosso, o coronel Percy Harrison Fawcett. Acredito que, pelo que já foi divulgado, devem conhecer a história, mas faço questão de reavivá-la em suas mentes. Fawcett era um arqueólogo independente, cheio de qualidades; um militar inglês com a aventura em suas veias, não fugia de obstáculos e não lhe faltava coragem; um homem místico e, sem dúvida, um dos maiores aventureiros da história real. A procura de cidades perdidas, Fawcett se embrenhou pelas matas fechadas e, próximo a um lugar denominado Serra do Roncador, desapareceu sem deixar vestígios. Fawcett acreditava que o Centro Oeste brasileiro havia sido o cenário do naufrágio do Continente da Atlântida, - disse o Dr. Constantino afastando-se para mais um café.

“Nossa! Em pleno século 21 um maluco milionário arregimenta especialistas em diversas áreas e lança-os em uma ridícula aventura de pura ficção. É incrível! Como posso me meter em tantas situações embaraçosas?” - pensei, perplexo. E então resolvi perguntar:

- Desculpe-me Dr. Constantino, mas quero crer que o senhor não pretende nos convidar para brincar de Indiana Jones, não é?

- Exatamente sr. Montezuma! Vocês foram escolhidos a dedo para essa jornada. Conheço cada um dos participantes deste evento; sei tudo sobre a vida de cada um e, tem mais, já providenciei um depósito bancário no valor de 500 mil reais para cada um de vocês e mais 500 mil serão, individualmente, depositados quando este trabalho tiver chegado ao seu final. Agora, se não se incomoda sr. Montezuma, gostaria de continuar a explanação, embora o senhor já tenha escrito muitas matérias e artigos sobre este assunto, disse em tom de quem gostaria de silêncio.

- O que eu fiz são textos literários, especulações que fazem com que esgotem os jornais nas bancas de revistas … - fui cortado imediatamente pelo Dr. Constantino que disse com sotaque inglês bem acentuado:

- Sr. Montezuma, conheço a sua situação deplorável. Aqui está o recibo do depósito feito em sua conta; com esse dinheiro poderá, por exemplo, comprar sapatos novos. Naquela caixa sobre a mesa está um notebock e uma câmera digital de última tecnologia, se houver interesse em nos seguir, pegue seu material e em silêncio comece a registrar nossa aventura, pois ela já começou.

Boquiaberto e constrangido, tentei esconder os pés e olhei, sem acreditar, para quantidade de zeros que haviam naquele recibo. “Nossa!” Não é que o velhote depositou mesmo os 500 mil reais! Abri a caixa e deixei o ancião mal humorado dar continuidade à suas elocuções fantasiosas. Pude perceber que quando o velho “manda chuva” falou que havia feito depósito em nossas contas, meus companheiros ficaram tão espantados que nem perceberam a fala do dr. Constantino numa referência, constrangedora, aos meus sapatos. Pensando bem, em alguns dias, no máximo um mês, eu estaria de volta e poderia novamente ter uma vida normal. Já fazia planos para o futuro: um apartamento, TV a cabo, internet, festas e …. mulheres! Nesse momento passei a incentivar a aventura. Eu estava empregado e ganhando muito bem, não havia motivo para reclamar.

- Bem, agora que o sr. dos sapatos risonhos resolveu prestar atenção, darei continuidade à palestra - alfinetou Constantino. O físico Bob Carlson coçou a cabeça e piscando os olhos pequenos e claros perguntou com sotaque americano:

- Quais os indícios da existência dessas cidades perdidas que levaram mister Fawcett a essa viagem sem volta?



- O coronel Percy Harrison Fawcett era amigo de grandes escritores, entre eles, Arthur Conan Doyle e Sir Rider Harggard que, em 1911, presenteou-lhe com uma estranha estatueta, de basalto negro que, possivelmente, seria proveniente de uma dessas cidades perdidas pelo interior do Brasil. Posteriormente, o próprio Fawcett teria encontrado diversas ruínas, na selva amazônica, que seriam indícios de postos avançados de uma cidade-mãe - esclareceu Constantino.

O instrumentista italiano Felipo Martinelli se mostrava inquieto e transpirava muito, talvez preocupado em não ser tão útil à expedição e, consequentemente, perder parte da bolada. Não sossegou enquanto não esclareceu a sua situação, perguntando:

- Desculpe-me - disse ele dirigindo-se ao Dr. Constantino - entendo a participação de todos os companheiros nesta viagem, no entanto, não consigo, por mais que eu tente, encaixar-me nela … sou um músico e ….
- Constantino cortou-lhe a fala:

- Todos aqui se encaixam perfeitamente na nossa aventura, inclusive você Felipo. Pode ficar tranquilo. Vou parar por hoje, todos devem estar ansiosos para tomarem providências particulares e, também, gastar um pouco da fortuna que acabam de receber. Enfim, façam tudo o que tiverem de fazer, hoje, pois a partir de amanhã, às 9h00, não nos separaremos mais. Tem mais … tenho dois quartos preparados para passarem a noite aqui e, assim sendo, ficarão dois de vocês em um, e três no outro quarto, organizem-se e bom descando - disse encerrando sua fala naquele dia.


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